Saturday 11 January 2014

Comissão de inquérito parlamentar: pescadinha de rabo na boca

O "Frente-a-Frente" desta semana com o Mário Crespo a moderar a discussão entre Catarina Martins e Luís Montenegro foi particularmente interessante. Não porque qualquer um deles tenha trazido novidades de monta, mas porque a conversa foi uma óptima ilustração da falta de validade de um instrumento da nossa democracia que seria, aparentemente, muito útil a complementar a acção do debate comum da assembleia da república.
Na troca de argumentos sobre as conclusões da comissão de inquérito parlamentar aos swaps, tornou-se evidente a sua total inutilidade. A maior parte da comissão é controlada pela maioria parlamentar que, na sua defesa do governo, vai muito além do simples "conflito de interesses". Assim, um inquérito feito nestes moldes permite a Luís Montenegro vir defender como verdade, como veredicto, que a culpa de tudo o que correu mal com os swaps foi do governo anterior e, em parte, dos bancos, e que nada pode ser imputado ao actual governo. Quando Catarina Martins lhe responde com casos em que os problemas advém nitidamente da actuação dos actuais governantes, o deputado do PSD esconde-se atrás da comissão parlamentar dizendo que nada disso foi concluído no inquérito. Quando a deputada do BE acusa a maioria de ter bloqueado, na própria comissão, qualquer conclusão onerosa para o actual governo, Luís Montenegro responde sorridente que a senhora deputada não pode estar à espera que os deputados dos outros partidos concordem com ela.
Ou seja, a maioria controla as conclusões da comissão de inquérito e depois usa-as para justificar os seus argumentos. É a verdadeira "pescadinha de rabo na boca".
Ora, tendo isto em conta, pergunto-me porque ainda se fazem inquéritos que podem abranger a actuação do governo em funções com comissões parlamentares. Será que somos tão cegos que ainda acreditamos que os deputados entram para a comissão e se tornam subitamente independentes e fiéis à verdade dos factos? Uma averiguação de todo o processo de contratação e cumprimento ou término dos contratos swap era obviamente necessária. Mas só é útil se pudermos confiar nas suas conclusões.

As comissões parlamentares tornam-se, assim, mais um mecanismo de atirar areia para os olhos dos demais, enquanto o governo em funções (seja ele qual for) vai actuando a seu bel-prazer. Uma tristeza para a nossa dita democracia e uma vergonha para o nosso parlamento.

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