Tuesday 16 August 2011

Desespero: medidas e discursos do XIX Governo Constitucional de Portugal

Sua excelência o nosso excelente Primeiro-Ministro espera que as excelentes famílias portuguesas "compreendam" que ele tem que cortar as despesas de forma excelente. Não se preocupe Pedro Passos Coelho, estou certo que os portugueses desempregados, sem dinheiro para pagar electricidade (alguns nem mesmo antes dos aumentos), casa, comida e por aí fora terão muito tempo para usar da sua capacidade de compreensão. Embora talvez não queiram, quando repararem que as pessoas eleitas para governar o seu país não conseguem, antes de tirar o pão da mesa dos menos afortunados, tentar balançar as contas do estado indo poupar nos ordenados, pensões, reformas dos milionários, nas parcerias público-privadas, aumentando os impostos sobre os maiores ordenados ou as grandes riquezas ou a banca (ou várias outras medidas - parece-me que por uma questão de justiça geral não se deve mexer nem num cêntimo de pessoas que vivem com até 500 euros por mês enquanto há tanta gente a viver com milhares ou dezenas de milhares de euros por mês). Talvez, dado ser impossível compreender isto quando nem se tem dinheiro para ligar a ventoinha a meio da tarde para refrescar a casa mal isolada que alugaram porque cabiam com os seus dois filhos esfomeados e não ficavam absurdamente longe do trabalho, talvez nesse momento prefiram não gastar o seu tempo a "compreender" as palavras e acções de Coelho e companhia. Talvez (e reforço sempre o uso da palavra talvez, porque, ao contrário dele, eu não "estou certo" de nada do que as pessoas pensam antes delas o dizerem) prefiram usar o seu tempo e imaginação a tentar arranjar uma maneira de não gastar tanto dinheiro, não pagar tantos impostos, roubar aos que têm muito dinheiro e, no desespero, mesmo aos que não têm assim tanto, para pelo menos poderem alimentar os filhos e pagar o tecto onde eles dormem. Estou certo de que argumentos como "o que estamos a fazer ficará na história", que não queremos o "caminho da conflitualidade", que temos que gastar (na Saúde) menos 10 a 15% do que em 2011 e "não há outra possibilidade" farão uma diferença importante no dia a dia das famílias que a crise e o governo colaboram para empobrecer, de forma que elas compreenderão tudo o que Pedro Passos Coelho quiser.

Já que estamos cheios de compreensão, porque não tentar compreender também que o Primeiro-Ministro de Portugal venha desconsiderar de tal forma o povo grego como num destes pobres discursos em que celebrou o facto de Portugal não ser visto como a Grécia (como quem diz, nós somos bons e eles são maus e na Europa percebem a diferença), isto dias depois de andarmos todos a queixar-nos de que lá fora viam Portugal como um bando de preguiçosos burros demais para se saberem gerir. Não seremos agora, por culpa de sua excelência o nosso Primeiro-Ministro, culpados precisamente da mesma coisa perante os gregos? De os ver como preguiçosos, como incompetentes e pouco compreensivos, conflituosos perante estas medidas, este discurso do "tem que ser"? Não estarão eles a lutar como nós devíamos lutar? Não deviam estar eles a discursar, queixando-se que lutam quase sozinhos contra as políticas que nos empobrecerão a todos? Que não temos outra forma de nos defender? Que os portugueses estão a ser tolos ao aceitar isto tudo pacificamente?

Tenho vergonha de pertencer a um país que elegeu para seu governador e representante esta figura. Tenho pena de pertencer de certa forma a este povo que, como alguém dizia noutro dia, é pacato e se deixa maltratar sem luta. Nunca como hoje pensei tanto em emigrar e não só por motivos económicos mas por vergonha e desespero. Por outro lado quero ficar cá, quero tentar o mais possível mudar o que quer que seja, nem que seja só um bocado, quase nada, para não deixar destruir Portugal.

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